As gentes de Angra no século XVII

Abstract

Valorizadas pela demografia histórica, as fontes paroquiais oferecem possibilidades de exploração que não se esgotam no tratamento estatístico dos comportamentos demográficos das populações. Aplicando a metodologia da reconstituição de paróquias que tem a vantagem, sobre a clássica metodologia de Fleury-Henry, de reconstituir percursos individuais em contexto familiar sem deixar de fazer a reconstituição de famílias, procedemos ao levantamento, organização e exploração dos registos paroquiais da cidade de Angra para um período de mais de cem anos (1583-1700). Por ausência de fontes elaboradas com o propósito de promover o estudo da população é comum a disparidade dos números com que se procuram medir os efectivos populacionais do período pré-estatístico. À incerteza dos números junta-se o desconhecimento do comportamento das diferentes variáveis que interagem na evolução demográfica das populações pretéritas. A reconstituição das paróquias de Angra abre caminho a que, a partir de fontes e metodologia, até agora, aplicadas fundamentalmente a contextos rurais, se possa conhecer a evolução e os comportamentos demográficos desta população que atravessou o século XVII num contexto urbano muito específico – o de cidade portuária situada na ilha que se havia transformado na chave do Atlântico. Potenciando a informação paroquial com recurso ao cruzamento de outras fontes – Constituições Sinodais, Actas de vereação e cronistas açorianos - pode avançar-se num conhecimento das gentes de Angra que não se esgota nos aspectos puramente demográficos. É possível evidenciar aspectos sociais, nomeadamente as actividades ocupacionais, a condição social, a presença de escravos e de estrangeiros, o reforço de laços sociais e os indícios de pobreza.

Mises en valeur par la démographie historique, les sources paroissiales nous offrent des possibilités d’exploration qui ne relèvent seulement pas du traitement statistique des comportements démographiques des populations. En nous aidant d’une mise en oeuvre de la méthodologie de la reconstitution des paroisses, qui, par rapport à la méthodologie classique de Fleury-Henry, présente l’avantage de reconstituer des parcours individuels dans un contexte familial, tout en faisant la reconstitution des familles, nous faisons le relevé, l’organisation et l’exploration des registres paroissiaux de la ville d’Angra au fil d’une période de plus de cent ans (1583-1700). Faute des sources élaborées et mises au point dans le seul but de mener une étude de la population, elle s’avère fréquente la disparité des chiffres permettant de mesurer des effectifs liés à la population de la période pré-statistique. À l’incertitude des chiffres vient s’ajouter la méconnaissance du comportement des différentes variables, agissant ensemble sur l’évolution démographique des populations passées. La reconstitution des paroisses d’Angra ouvre la voie a ce que, à partir de quelques sources et d’une certaine méthodologie, appliquées jusqu’à présent à des contextes ruraux, on puisse connaître l’évolution et les comportements démographiques de cette population qui a traversé le XVIIè siècle dans un contexte urbain très spécifique – celui d’une ville portuaire située sur l’île, devenue à l’époque la clé de l’Atlantique. Tout en rendant possible l’information paroissiale à l’aide de l’enchaînement d’autres sources – constitutions synodales, procès-verbal du conseil municipal, chroniqueurs açoriens – on peut bel et bien s’acheminer vers une connaissance des gens d’Angra, qui n’est pas limitée aux seuls aspects démographiques. On peut donc mettre en évidence des aspects sociaux, notamment les activités ayant trait aux occupations, la présence des esclaves et des étrangers, le renforcement des liens sociaux et les indices de pauvreté.

The parochial sources, valued by the historical demography, offer possibilities of exploitation that go beyond the statistic treatment of the demographic behaviour of populations. By applying the methodology of parishes reconstitution, which has the advantage, over the classic methodology of Fleury-Henry, of reconstituting individual courses in a familiar context as well as of doing the reconstitution of families, we have made the survey, the organization and the exploitation of the parochial registers of the city of Angra for a period of over one hundred years (1583-1700). Since there are no sources created with the purpose of promoting the study of the population, the disparity of numbers used in order to try to measure the effective numbers of the population, in the period before statistics existed, is common. Together with the uncertainty of the numbers there is the lack of knowledge concerning the behaviour of the different variable that interact in the demographic evolution of the populations of the past. The reconstitution of the parishes of Angra offers a chance to get to know, with the help of sources and methodology that, up until now, were mainly applied to rural contexts, the evolution and the demographic behaviours of this population which has crossed through the 17th century in a very specific urban context – the urban context of a port city situated on the island that had become the key of the Atlantic. By making the parochial information stronger through the resort to other sources – Synodal Constitutions, Minutes of the town council and Azorean chroniclers – we can develop our knowledge of the people of Angra, which does not only concern purely demographic aspects. It is possible to evidence social aspects, namely the occupation activities, the social condition, the presence of slaves and foreigners, the reinforcement of social ties and the signs of poverty.