O Ventre do Capital: Um estudo sobre a reprodução escravista no Brasil do século XIX

Abstract

Para se descobrir e compreender como questões relativas ao gênero, nomeadamente a opressão sobre as mulheres, poderiam ser moldadas e dinamizadas pela economia-mundo capitalista, esta dissertação debruçou-se sobre uma região periférica do sistema-mundo capitalista, o Brasil, um modelo de controle de trabalho, o escravo, e um acontecimento que envolvia diretamente as mulheres alocadas nesta geografia e empregadas neste modo de produção, a proibição do tráfico internacional de escravos. Com o auxílio das teorias da reprodução social, segunda escravidão e sistema mundial moderno foi possível desenvolver e perceber a dimensão desta problemática, resolvida por meio da análise documental de manuais de agricultura escritos por senhores de escravos no século XIX. Entendeu-se que, conforme a temperatura das disputas políticas e comerciais na economia-mundo aumentava, enquanto também exigia uma maior produção das commodities tropicais, alteravam-se práticas relativas à reprodução de trabalhadores escravizados, as quais envolviam o controle sobre o corpo feminino escravizado. Mais, afirmou-se que a reprodução escravista, e por consequência a opressão sobre as mulheres dela derivada, tem um caráter específico em razão de estar inserida dentro da economia formal escravista. Acentuou-se que, diferentemente do modelo de controle de trabalho assalariado, em que a reprodução dos trabalhadores se realiza numa esfera distinta da esfera produtiva, no modelo de controle de trabalho escravo, a reprodução dos trabalhadores ocorria numa única esfera, que agregava tanto os processos produtivos como os reprodutivos.

Willing to find out and to understand how questions related to gender, namely the oppression of women, could have been shaped and dynamized by the capitalist world-economy, this dissertation focused on a peripherical zone of the capitalist world-system, Brazil, a method of labor control, the slavery, and an event that directly embraced the women allocated in this geography and employed in this mode of production, the prohibition of the international slave trade. Helped by the social reproduction theory, the second slavery theory and the modern world system theory, it was possible to develop and to realize the extension of this problematic, that was solved with a documental analysis based on agriculture manuals written by slave owners in the XIX century. It was perceived that as the temperature of politics and trade disputes in the world-economy got warmer, while also demanding a greater production of tropical commodities, the social practices related to the reproduction of enslaved workers were affected, which involved the control over the enslaved female body. Furthermore, the oppression laced with the reproductive capacity of enslaved women revealed a specificity due to being inserted within the formal slave economy. It was noticed that, differently from the waged labor in which the reproduction of the workers took place in a distinct sphere from the productive sphere, in the slave method of labor control, the reproduction of workers occurred in a single sphere, which aggregated both productive such as reproductive process.